Em meio a um cenário em que o uso da bicicleta como transporte alternativo em grandes centros urbanos vem ganhando cada vez mais espaço, a BBC Brasil enviou dois de seus repórteres às ruas de Londres e São Paulo para ver de perto como é pedalar em duas das maiores cidades do mundo, com suas ruas congestionadas e seus sistemas coletivos sobrecarregados.
Embora na visão de ativistas e analistas a capital britânica ofereça melhores condições para os ciclistas do que São Paulo, muitos londrinos se mostram insatisfeitos e buscam inspiração na Holanda e na Dinamarca para pressionar por mais infraestrutura para as bicicletas.
Por outro lado, na maior cidade do Brasil, há sinais de uma ainda embrionária maior consciência rumo a um trânsito compartilhado, incluindo iniciativas do governo nesse sentido – mas cicloativistas argumentam que, dadas as dimensões locais, as políticas públicas ainda são insuficientes.
Ambas as metrópoles, no entanto, ainda falham ao proteger os que optam pela bicicleta como meio de transporte, registrando dezenas de mortes de ciclistas anualmente. Em 2011, 17 ciclistas perderam a vida nas ruas londrinas, enquanto na capital paulista foram 49 – o que representa praticamente uma morte por semana.
Comparação – Entre as semelhanças, motoristas em geral e taxistas tendem a competir por espaço e muitas vezes avançam sobre faixas dedicadas aos ciclistas.
Mas, por exemplo, no caso dos ônibus, em Londres os motoristas recebem treinamento especial para não expor os ciclistas a riscos, enquanto em São Paulo os coletivos representam uma das maiores ameaças à vida dos que optam pela bicicleta.
As diferenças entre as duas metrópoles também são evidenciadas pelos tipos de campanhas de ativistas e entusiastas do ciclismo.
Se na Grã-Bretanha o objetivo é fazer valer as ciclofaixas e ciclovias já existentes e relembrar um compromisso do governo para tornar a estrutura para o ciclista mais semelhante à de cidades da Dinamarca e da Holanda, no Brasil a principal meta ainda é batalhar pela inclusão da bicicleta no espaço urbano de forma segura e exigir a construção de infraestrutura para isso.
Em outras palavras, se em Londres os donos de quase um milhão de bicicletas estão nas ruas e lutam por avanços, na cidade de São Paulo, onde há mais de três milhões de bicicletas, muitos ainda temem usá-las como meio de transporte diário nas principais avenidas, reservando-as somente para o lazer nos fins de semana.
Perspectiva – Tom Bogdanowicz, diretor da ONG London Cycling Campaign, disse à BBC Brasil que um abaixo-assinado conseguiu a adesão de 42 mil pessoas durante a última campanha eleitoral para a prefeitura de Londres – sobretudo exigindo mais segurança.
“Milhares saíram às ruas em um passeio que organizamos em apoio a isso, e agora nós estamos cobrando o candidato vencedor, Boris Johnson, sua promessa de deixar nossas ruas tão convidativas e seguras como as da Holanda”, diz.
Já a paulistana Renata Falzoni, cicloativista e bikerrepórter com mais de 30 anos de experiência, diz que é preciso colocar a situação das duas cidades em perspectiva.
Ela diz que em Londres as ruas são compartilhadas como reflexo de uma política pública que prima por isso, mesmo que ainda haja muito o que avançar, enquanto em São Paulo ciclistas têm que dividir as ruas com os carros porque essa é a única opção, diante da ausência de políticas mais efetivas.
Lentidão – É fato que a capital paulista possui ciclovias, como a da marginal do rio Pinheiros, mas elas são vistas como insuficientes diante das dimensões da cidade e ativistas também apontam para a falta de integração com estações de metrô e o restante do sistema viário.
O assunto foi tema de campanha eleitoral para a prefeitura paulistana no ano passado e há iniciativas recentes, como a instalação experimental de faixas para ciclistas largarem à frente dos carros em semáforos, semelhantes às de Londres.
Mas cada vez que um ciclista morre em uma das principais avenidas da região central da cidade, o debate é retomado e ativistas voltam a apontar que é preciso fazer mais.
“Nesses últimos 30 anos já rodei 27 países de bicicleta, e nesse tempo, São Paulo mudou, mas muito lentamente. As políticas públicas são sempre muito atrasadas. No entanto, um conceito de que as ruas são para as pessoas não acontece, as ruas ainda são voltadas primordialmente para os carros. Elas continuam sendo traçadas, planejadas e geridas sempre com a preferência para os veículos”, diz Falzoni.
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Fonte: BBC Brasil