Por Ivan Bianchessi Banzatto – Você gosta de cultura, história, natureza e boa culinária? Então a Estrada Real é o lugar ideal para você desfrutar e fotografar tudo isso com uma pitada de cultura barroca mineira. Os caminhos da Estrada Real estão entre os mais desejados para os amantes de esportes ao ar livre (assim como eu), e também contam com ótima infraestrutura para o viajante. A estrada pode ser percorrida de bike, a pé, a cavalo, moto ou em veículos 4×4.
Tendo isso na cabeça, decidi conciliar meu esporte favorito (moutain bike) com a vontade de aprender sobre culturas locais e me juntei a mais 8 amigos para pedalar um trecho da estrada, o Caminho dos Diamantes.
História: até o final do século 17, a região era habitada apenas por índios (Guaianás e Tamoios), que eram os únicos que conheciam os caminhos desde o norte de Minas Gerais, norte de São Paulo até o Rio de Janeiro. Próximo do ano de 1725, a Coroa Portuguesa decidiu criar o primeiro trecho, o Caminho Velho ligando Ouro Preto (antiga Vila Rica) até Paraty.
Esse caminho esse serviu para facilitar os saques de ouro de nossas queridas terras, e também traficar escravos africanos para as fazendas de café mineiras. Esse primeiro caminho também era chamado de Caminho do Ouro.
Posteriormente, a realeza portuguesa oficializou mais dois caminhos: Caminho Novo (Ouro Preto à Rio de Janeiro), e Caminho dos Diamantes (Diamantina à Ouro Preto) com o objetivo de escoar os nossos valiosos diamantes e controlar a exploração de ouro.
Para pedalar os mais de 400km do Caminho dos Diamantes, foram necessário mais de 2 meses de planejamento e pesquisas sobre pousadas, atrativos e informações turísticas, etc, que no dia 12-Jul-14 deu-se a partida para essa aventura.
1º dia de viagem: depois de carregarmos o micro ônibus (que nos serviu de carro de apoio) com as malas e bikes, saímos de nossa cidade natal, Itapira-SP, com destino à Diamantina. Depois de mais de 12 horas de viagem chegamos à Diamantina.
O plano era pedalar de Diamantina à Ouro Preto e visitar alguns pontos turísticos ao longo do caminho.
Pontos Turísticos: Caminhos dos Escravos em Diamantina, Parques Nacionais da Serra do Espinhaço e Serra do Cipó, Cachoeira do Tabuleiro com 273m (a 3ª maior do Brasil), Santuário do Caraça, as minas de ouro e diamante, as lindas igrejas construídas nos estilos rococó e barroco mineiro, Sítio Arqueológico da Pedra Pintada e claro, a cidade de Ouro Preto com sua maravilhosa arquitetura repleta de história e cultura mineira.
2º dia de viagem: saímos perto das 8:00 da manhã de Diamantina para o 1º dia de bicicleta, com destino final no dia em Serro, onde dormiríamos a primeira noite. Foram percorridos 62km, passando por São Gonçalo do Rio das Pedras, a mística Milho Verde onde encontramos uma comunidade circense que praticavam slackline, musica e malabares, etc,, e chegamos ao final do primeiro dia.
A cidade de Serro é conhecida pela culinária local que tem o queijo e pão de queijo como seu maior patrimônio cultural. Os primeiros dias de pedaladas foram os mais pesados e exigiram do grupo um bom preparo físico para vencer as longas subidas.
Religião: o planejado era que todas as chegadas diárias fossem nas igrejas matriz de cada cidade, sempre com esse ponto de referência pudemos perceber que a religiosidade seria um traço constante no caminho.
3º dia de viagem: saindo de Serro enfrentamos o que seria o dia mais difícil fisicamente. Subidas íngremes e intermináveis que compõem o trecho total de 87km.
Subidas: nesse dia pedalamos a mais longa delas com 10km, entre os vilarejos de Itapanhoacanga e Santo Antônio do Norte (Tapera) onde as pernas doeram muito, é bom que você esteja preparado.
O dia terminou na cidade de Conceição do Mato Dentro, que tem forte exploração de minério de ferro. O ponto negativo dessa exploração é que o turista não é valorizado, as pousadas são caras e não fomos bem recebidos. Decidimos então continuar e ir direto para o distrito de Tabuleiro (mais 19km), onde poderíamos chegar mais rápido à cachoeira que dá nome ao distrito. Esse trecho colocamos as bikes no micro ônibus, pois as pernas já estavam esgotadas.
4º dia de viagem: esse seria um dia de turista, sem bike e dando um descanso às doloridas pernas. Então decidimos visitar a fabulosa cachoeira do Tabuleiro que é a 3ª maior do Brasil, com 273 metros de altura. No inverno a temporada é de seca e infelizmente a cachoeira tinha pouca água.
Seguindo o 5º dia de viagem, pedalamos mais 68km até a cidadezinha de Itambé do Mato Dentro, onde encontramos um povo muito hospitaleiro. Região de muitas cachoeiras onde mais uma pausa foi obrigatória para visitação.
Cachoeiras: a cidade também possui várias delas e decidimos ficar o 6º dia novamente sem bicicleta para conhecer mais sobre essas lindas obras de arte da natureza. Visitamos as cachoeiras da Maçã e do Funil.
Em nosso 7º dia de viagem, continuamos de bike por mais 76km até o município de Cocais. A partir desse ponto, sabíamos que o físico não seria tão necessário quanto nos primeiros dias, pois as subidas não eram tantas e com vários trechos de asfalto. Então, comparando com os primeiros dias de sofrimento nas subidas intermináveis, foi um verdadeiro passeio de bicicleta. Chegando em Cocais, pudemos ver um vilarejo muito pequeno e bem aconchegante, e lá perto alguns de nós visitaram o Sítio Arqueológico da Pedra Pintada (eu não), que possui pinturas rupestres com mais de 6 mil anos.
8º dia de viagem: mais um dia de passeio de bike, rodamos 48km até chegar à charmosa cidade que mais me agradou em toda viagem, Catas Altas. No caminho passamos pelo Bicame de Pedra que é um aqueduto construído pelos escravos em 1792, com 4 metros de altura e estruturado apenas com encaixe de pedras, sem qualquer tipo de concreto.
Em Catas Altas, encontramos um forte contraste entre o interior de Minas Gerais e cidades construídas pela civilização do ouro. Nesse ponto, deixamos pra trás as casinhas com janelas quadradas e coloridas, carroças de boi, vilarejos e ruas de terra, para literalmente entrar na arquitetura barroca, graciosa e cheia de pompa como as cidades de Ouro Preto e Mariana seriam. Cidades maiores, mas não com menos história ou cultura dos vilarejos que deixamos pra trás.
9º dia de viagem: saindo de Catas Altas, seguimos pedalando em direção à cidade que guarda os maiores tesouros da exploração do ouro no Brasil, Ouro Preto. Mas para chegar lá, teríamos que vencer os últimos 64km que nos restavam.
O trajeto nesse dia é tranquilo e encontram-se muitos trechos de asfalto. Quando chegamos em Mariana, percebi que a religiosidade é muito forte por lá, há igrejas por toda parte e como atração principal, existem as igrejas de São Francisco de Assis e Nossa Senhora do Carmo que ficam na mesma praça, uma ao lado da outra e tem obras de Aleijadinho e Mestre Ataíde.
Saindo de Mariana, passamos pela Mina da Passagem, uma antiga mina de extração de ouro desativada, e considerada a maior mina de ouro para visitação no mundo.
O viajante é levado por um carrinho de mineiro que é levado por um motor à ar comprimido original da época. A mina tem 360m de profundidade, e descemos 120m apenas pois boa parte da mina está inundada. Lá pode se praticar mergulho com cilindro ou apenas um banho.
Continuando o ultimo dia de bike, pedalamos pelo asfalto até chegar na cidade de Ouro Preto perto das 6 da tarde, mais precisamente na Praça Tiradentes. Eu, que sempre era o último a chegar nas cidades, fazia questão de ver o pôr-do-sol da estrada, assistindo de camarote o sol caindo por trás das belas montanhas de Minas Gerais. Assim eu chegava feliz por mais um dia de sacrifício e recompensa.
Depois de tanto esforço, chegamos ao nosso objetivo final na cidade de Ouro Preto, e foi um dos momentos mais felizes da minha vida que ficará gravado em minha memória pra sempre. Tenho na memória como se fosse uma fotografia, todo o grupo sentado na praça, tomando aquela merecida cerveja, cansados mas felizes! Imagem de uma galera reunida celebrando mais uma belíssima viagem com amigos que nesse momento viraram irmãos.
Todos os quilômetros percorridos valeram muito a pena pois vive-se mesmo a cultura da extração do ouro e diamante que ainda perdura na região mesmo a extração não existindo mais. Cultura do café com pão de queijo, da simplicidade, da vida sofrida para encontrar na terra o sustento da família. Ah Minas Gerais, quem te conhece não esquece jamais!
Valeu a pena pelo companheirismo do grupo, todos sempre alegres e brincalhões. É uma viagem que recomendo à todos, planeje e vá. Podem me escrever se necessário, terei o enorme prazer de ajudá-lo.
Abraços!