Sol e sensação térmica na cara de 50 graus castigam os bikers. Na disputa pelo título, Hans Becking e Jiri Novak vencem e diminuem a vantagem para os líderes Daniel Geismayr e Hermann Pernsteneir
O sol inclemente da Chapada Diamantina tem sido um obstáculo a mais na Brasil Ride. Em certos pontos das trilhas, a sensação térmica pode chegar a 50 graus. Os bikers sofreram novamente na etapa desta quinta-feira (22). Da largada, às 8h, até a chegada, no final da tarde, quando cruzaram os últimos colocados, nenhuma nuvem apareceu no céu da Bahia para oferecer o refresco de uma sombra aos atletas. Melhor para quem conhece bem o percurso e é da casa. Não por acaso, as três duplas vencedoras sabiam o que enfrentariam. Atual campeão em parceria com tcheco Jiri Novak, o holandês Hans Becking cruzou a linha de chegada em primeiro. Logo atrás vieram os brasileiros Hugo Prado Neto/Lukas Kauffmann (suíço radicado em Belo Horizonte) e Henrique Avancini/Wolfgang Olsen.Becking/Novak venceram com o tempo de 4h24min21 e colocaram um pouco de pimenta na disputa pelo título. Isso porque os líderes Daniel Geismayr e Hermann Pernsteneir, da Áustria, cruzaram em quarto lugar, após 4h37min15, e viram sua vantagem no acumulado cair de 27 para 14 minutos. Para seguir na perseguição até o final, o atual campeão sabe que precisa ‘sobreviver’ ao clima. “Sinto que a cada ano está mais quente. Na parte plana você sentia um vento quente, com cerca de 40 graus. Então ficava muito difícil forçar nessa parte. Na Holanda está congelando nessa época do ano, e chove a cada dia. Então, não estamos nada acostumados com isso. Procuramos não exagerar no ritmo para sobreviver a semana inteira. Nesta quinta etapa não fizemos diferente.”
Os brasileiros protagonizaram uma chegada emocionante. Hugo Prado Neto/Lukas Kauffmann e Henrique Avancini/Wolfgang Olsen duelaram roda a roda a partir da última subida. Na chegada, em Rio de Contas, prevaleceu a melhor tática. Prado abriu vantagem a partir do último quilômetro e deixou para Kauffmann, dono de um melhor sprint, duelar com os adversários até a reta final, onde novamente se encontraram para cruzar em segundo, com apenas 1 segundo de diferença – 4h36min37 e 4h36min38. Após o grande resultado, Lukas deixou transparecer o desgaste. “Sofri muito na quarta-feira, dormi mal, acordei com a cara inchada, nariz entupido. Com isso, o sofrimento foi demais no início da prova, mas fui recuperando. O ritmo não estava tão alto e consegui segurar. No final, a nossa tática deu certo. Mas o calor está demais. Podia chover um pouco. Está um verdadeiro inferno.”
Henrique Avancini elogiou a tática dos adversários e recomendou cuidado a todos os atletas até o final da Brasil Ride quanto ao calor. “Por pouco não fizemos segundo lugar, mas estamos bem felizes porque fizemos uma etapa progressiva. Estava realmente muito quente. Nesta quinta, talvez tenha sido até um pouco menos sofrida em relação a temperatura, porque podíamos pedalar um pouco mais rápido. Mas é o quinto dia e a fadiga acumulada é considerável e todos sofrem bastante. É muito importante, para amadores e elite, ficar atentos e se cuidar para a etapa de amanhã (sexta-feira), que é mais longa e vai estar realmente muito quente”, antecipou.
Líderes da Brasil Ride e quarto colocados na etapa, os austríacos Daniel Geismayr e Hermann Pernsteneir sofreram em dose dupla, com calor e problemas com as bikes. “Acredito que foi o dia mais quente de todos os cinco de prova. Tomei cerca de dois litros em dez minutos, algo inacreditável”, disse Daniel. Hermann completa. “Estava muito quente e ainda tivemos três pneus furados. Precisamos vedar os pneus em três oportunidades, o que complicou mais ainda.” Sobre a briga pelo título ficar mais acirrada, Daniel foi claro. “Essa diferença é quase nada se pensarmos friamente para os dias atuais. Foi um dia muito ruim para nós. Não foi nada divertido. Apenas pedalar e correndo atrás do tempo perdido com os problemas mecânicos.”
Calor e estratégia para manter a liderança – Líderes da Ladies, Raiza Goulão e Viviane Favery conseguiram, nesta quinta-feira (22), aumentar outra vez a vantagem na liderança. Ao completarem a prova em 5h57min36, a dupla brasileira terminou cerca de 18 minutos à frente das italianas Annabella Stropparo e Elena Gaddoni. “Hoje (quinta-feira) estava bem quente, porém, acho que ontem (quarta-feira) chegou a ser até pior. Porque quando saímos do Kamikase entramos em um local muito abafado, a sensação térmica era muito alta. Nesta quinta-feira vi em meu aparelho de GPS que estavam 45 graus em determinado momento”, destacou Raiza Goulão.
Apesar da terem completado, em 6h15h59, as italianas Annabella e Elena não tiveram um bom dia. Com a suspeita de fratura no braço direito, Elena pode ficar de fora da disputa, o que impossibilitaria a dupla de brigar pelo título. “Mudamos a estratégia com algumas dicas que dei para a Vivi na largada. Conseguimos andar com as italianas no começo e depois atacamos com sucesso na parte técnica. Faltam 210 km, nos dois dias de prova. Impomos um ritmo mais tranquilo comparado aos dias anteriores. Fazíamos as decidas técnicas poupando o equipamento, mas minha bike full-suspesion me leva a outro nível,então, é muito difícil de tirar o pé. Temos que administrar, mas depois que larga é difícil pensar nisso”, avaliou Raiza.
De volta a Mucugê – A sexta etapa da Brasil Ride será disputada nesta sexta-feira (23), com largada às 7h de Brasília (6h no horário local), em Rio de Contas. O penúltimo estágio da competição leva os bikers de volta à cidade de Mucugê, onde a aventura na Chapada Diamantina começou no último domingo (18).
Logo no início, a prova tem um longo downhill em estrada de terra, um trecho que exige muito cuidado dos ciclistas. No total, a sexta etapa é recheada de subidas, com altimetria acumulada de 2.854 metros de altitude. No km 96 começa a serra onde normalmente acontecem os pegas finais para a definição dos vencedores. Os 20 km finais são planos, sendo que os últimos 15 km são percorridos no asfalto, onde os atletas tentam ‘soltar’ mais as pernas e garantir velocidade para cruzar a linha de chegada.
“Tivemos o cuidado de colocar mais pontos de hidratação este ano para que os atletas consigam fazer a etapa mais hidratados, pois eles estão desgastados após cinco dias de provas. Por ser uma etapa dura, perto do final da competição, nada está definido. Mesmo que os líderes já tenham uma diferença considerável para o segundo e terceiro colocados, por ser uma etapa longa, tudo pode acontecer. Quem é ponteiro pode perder posições se alguma coisa der errado ou se não estiver com tanta endurance para completar”, informa Rafael Campos, diretor técnico da Brasil Ride.
Classificação após a 5ª etapa
Open
- Hans Becking/Jiri Novak – Superior-Brentjens – 4h24min21
- Hugo Prado Neto/Lukas Kaufmann – Oce Cannondale – 4h36min37
- Henrique Avancini/Wolfgang Olsen – Cannondale/Ava Project – 4h36min38
Ladies
- Raiza Goulão (BRA)/ Vivi Favery – Specialized Women – 5h57min36
- Annabella Stropparo (ITA)/Elena Gaddoni (ITA) – Scapin Soudal – 6h15min59
- Isabela Lacerda (BRA)/Nina Baum (EUA) – LM Shimano – 6h27min12
Homenagem aos Blue Angels – Os 15 mecânicos da Shimano, verdadeiros salva-vidas das bikes na Brasil Rider, foram homenageados no jantar da noite de quarta-feira, em Rio de Contas. Conhecidos como Blue Angels, todos receberam uma placa de reconhecimento das mãos de Mário Roma, criador do evento, e aplausos de conhecimentos dos ciclistas.
Veteranos nas estradas, novatos nas trilhas – Ícones do ciclismo de estrada brasileiro, os atletas olímpicos Márcio May e Daniel Rogelin trocaram o asfalto pelas trilhas da Brasil Ride 2015. Companheiros de equipe por 10 anos quando competiam na elite do esporte mundial, os catarinenses estão na briga pelas primeiras colocações na categoria Master da sexta etapa da ultramaratona disputada na Chapada Diamantina, na Bahia.
Aos 43 anos, Rogelin faz sua estreia na Brasil Ride. “O Márcio me convidou e estou muito feliz. Apesar de não ser a nossa especialidade, estamos disputando posições na categoria. Andar no meio desses mestres da modalidade é muito legal. Isso é um intercâmbio, uma troca de experiências. Somos todos da mesma tribo e gostamos de pedalar”, disse o atleta, que disputou a Olimpíada de Atlanta, em 1996, e ainda hoje compete na elite do ciclismo de estrada.
May está em sua quarta Brasil Ride. “Nas duas primeiras vezes, disputei com um colega de Santa Catarina apenas para completar, tranquilo. Em 2013, corri com o Márcio Ravelli (decacampeão brasileiro e medalha de bronze no Mundial de Mountain Bike) e a gente fez segundo na Master. E foi uma dupla bem diferente. Ele muito técnico, eu braço duro, andando melhor nas estradas. Mas a gente se entendeu. Ano passado não competi e agora convidei o Rogelin, só que não andamos juntos nenhuma vez até chegar na Chapada. Mas está dando certo”, conta o ciclista de 44 anos, que representou o Brasil em três Jogos Olímpicos (Atenas, Atlanta e Barcelona).
A experiência no asfalto não interfere na nova paixão pelas trilhas. “Sempre gostei de mountain bike, que está muito forte. O ciclismo de estrada tinha se espelhar nesse segmento para crescer junto, porque o MTB se desenvolve em todas as regiões, todos os estados, especialmente com eventos como a Brasil Ride”, avalia Rogelin. May também comenta. “A estrutura da Brasil Ride aumentou. O evento cresceu e acredito que é um dos principais do mountain bike do mundo. Nunca corri fora, mas pelo que sei, não fica atrás de nenhum. O legal aqui é porque, além do pessoal de elite, tem 500 pessoas que estão tendo seu desafio pessoal e é bacana ter essas pessoas no meio. A elite é referência, mas quem faz a grande festa é o amador, que está curtindo ao mesmo tempo que sofre para caramba nas trilhas. E isso é bacana, porque dá para todo mundo participar todo mundo.”
Veteranos no ciclismo e novatos no mountain bike, May e Rogelin pretendem continuar a pedalar nas trilhas pelo Brasil. “Depois que parei de competir profissionalmente, acabei andando um pouco mais de mountain bike, mas de boa. Aí o Mário (Roma, criador da Brasil Ride) me convidou pra participar. E eu disse: Meu Deus! Eu tinha parado, estava gordo e acabou sendo uma forma de voltar a pedalar de novo. E desde a primeira vez que competi, melhorei muito na técnica. Claro que não como os caras que correm MTB a vida toda. Mas na quarta-feira(21), fiz a trilha bem. No primeiro ano, fiz tudo andando. Hoje eu empurrei só uns pedacinhos muito técnicos”, conta May.