21 de novembro de 2024
Powermeter
Foto: Divulgação / Shimano

Clínica Técnica CIMTB: Como treinar com medidores de potência

Como a tecnologia eletrônica pode auxiliar na performance de atletas de alto rendimento

Poucas ferramentas transformaram tanto o ciclismo quanto o medidor de potência. A tecnologia, que chegou para os profissionais antes até que os quadros em carbono, muda completamente a forma de treinar e de competir. Com os dados, os softwares e os treinadores adequados, o atleta pode ser comparado a um carro de Fórmula 1, onde a telemetria guia os limites da performance.

Powermeter
Foto: Divulgação / Shimano

Ciclistas como Greg LeMond, tricampeão do Tour de France, já utilizavam o equipamento em suas bicicletas no final dos anos 80 e início dos anos 90 para obter vantagens sobre os concorrentes, sobretudo no contra-relógio. A partir dos anos 2000, o equipamento atingiu em massa o esporte de elite, e já permeava algumas camadas de amadores com mais recursos financeiros. Como toda inovação, os produtos demoram para ser democratizados, e ainda são muito caros para a maioria.

Na última década, porém, com o avanço da tecnologia, uma quantidade maior de pessoas teve acesso ao power meter, o que permitiu a criação de uma massa crítica de dados produzidos por ciclistas de diversas modalidades. A tendência é que essa nuvem de informações cresça ainda mais e continue transformando a forma de treinamento.

Para falar sobre esse assunto, a organização da Copa Internacional de Mountain Bike (CIMTB) convidou três especialistas: O tricampeão do Cape Epic e treinador a mais de 20 anos, Abraão Azevedo, o fundador da OCE Powerhouse, Hugo Prado Neto e o campeão brasileiro de XCO e campeão da CIMTB, Marconi Ribeiro.

SRM Origin Road Carbon
Medidor de potência SRM Origin Road Carbon

História – Com mais de 20 anos de experiência com os medidores de potência, Hugo Prado Neto conta que os primeiros protótipos portáteis, possíveis de serem utilizados em treinos de estrada, foram criados em 1986 pelo engenheiro-médico alemão Ulrich Schoberer, fundador da Schoberer Rad Messtechnik (SRM).

“O medidor de potência é uma tecnologia que veio antes das peças em carbono. Nos anos 90, já tinha gente no pelotão profissional utilizando”, conta. Em 1991, o time alemão de ciclismo de estrada usava pela primeira vez os equipamentos em um training camp na Suíça.

A partir de meados dos anos 2000, os medidores começaram a ser vendidos junto com os pedivelas padrão das principais marcas e com a tecnologia wireless, que permitiu uma ligação direta com os computadores.

Atualmente, existem várias marcas e tecnologias diferentes, cada uma com vantagens e desvantagens em relação aos concorrentes. O mais importante, segundo Abraão Azevedo, é entender que sempre há diferença entre os aparelhos. “Existe até 2% de erro nos equipamentos que a gente recomenda. Mas o mais interessante é compreender que você vai comparar seus números com os parâmetros definidos nos seus testes, e não comparando com o de outros atletas”, lembra.

Treinando com o medidor de potência

O maior benefício, de acordo com Marconi Ribeiro é a assertividade e a regularidade nos treinos. “Com o medidor de potência, é possível realizar um treino muito mais fidedigno ao proposto. A resposta da potência no computador é imediata e absoluta, enquanto os outros parâmetros como frequência cardíaca, por exemplo, são variáveis de acordo com o contexto”, explica.

Garmin Vector 3
Garmin Vector 3

Essa precisão permite aos treinadores prescreverem treinos na medida exata, com a volumetria, a intensidade e o descanso bem balanceados. Com isso, explica Hugo, é possível treinar menos, recuperar mais e obter uma performance melhor ainda. “Quanto menos tempo o atleta treina, se o treino for aproveitado a máximo, mais tempo ele tem para se recuperar. Isso faz total diferença”, lembra.

Com um indicador fixo, as outras variáveis da performance também podem ser trabalhadas com mais assertividade. “Como atleta e treinador, eu percebo que essa ferramenta me permite ‘brincar’ com os outros elementos. No sentido de testar uma configuração diferente de suspensão, de pressão de pneu, de cadência, e avaliar nos meus treinos, ou no dos meus atletas, o que é mais eficiente. Um resultado prático, por exemplo, foi durante a transição da especialidade de XCO para a de maratona, quando aumentei em 20% o volume de treinos para me adaptar às novas demandas”, explica Abraão Azevedo.

Competindo com o equipamento

Outro fator que foi completamente afetado pela chegada dos medidores de potência foi a forma de administrar o esforço durante a competição. A percepção de esforço, que era um fator definitivo nos resultados, passou a ser controlada pelos números. O que, de acordo com os especialistas, tem o lado bom e o lado ruim.

Os competidores conseguem monitorar em tempo real o fator de intensidade, abreviado por IF, no jargão técnico. Ele mostra, numa escala de 0 a 1, qual é a intensidade do esforço do atleta. Isso permite que ele escolha com precisão onde são os melhores pontos para atacar, onde é mais eficiente poupar energia e outras estratégias.

Por outro lado, o uso excessivo dos números nas competições pode tirar o fator surpresa das corridas. “Hoje é difícil você ver um atleta quebrar na pista, como acontecia antigamente. As disputas ficaram mais apertadas por conta disso. O medidor também trouxe isso para o mundo do ciclismo”, avalia Marconi.

O futuro – Ao longo de anos de desenvolvimento de técnicas e estratégias mais eficientes de treinar e competir, os atletas chegaram num ponto em que as performances ficaram muito similares, e passou a ser necessário pensar fora da caixa. “Agora os atletas precisam ver além dos números, arriscar mais nos ataques. É uma tendência que tenho percebido”, conta Marconi.

Hugo acredita que o próximo passo é decodificar os parâmetros emocionais e fisiológicos dos atletas. “Um dos parâmetros mais contemporâneos é o Heart Rate Variation (HRV), que ajuda a entender a recuperação do atleta”. O HRV é um indicador que mede as diferenças de tempo entre as batidas do coração.  Um HRV alto significa que o atleta está preparado para responder rapidamente aos estímulos, portanto, está preparado para receber mais carga de treino. Um HRV baixo significa que o corpo está sob estresse e pode indicar overtraining.

“Um componente importantíssimo da performance, que é negligenciado muitas vezes pelos atletas e treinadores, é o emocional. Nós variamos muito o rendimento por conta do nosso estado emocional também. Então, eu tenho certeza que os próximos avanços da ciência em relação a esse assunto será algo ligado à neurociência”, explica Hugo.

Fonte: CIMTB, por Pedro Parisi

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